Suzana Herculano-Houzel, sobre a Homeopatia
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Tratar só com homeopatia dá prisão na Austrália
"Mas homeopatia funciona! Você é que não entende de nada!", me dizem os adeptos. Escrevi para a Folha de SP uma vez comentando nosso poder de auto-sugestão a respeito da astrologia e profecias auto-cumpridas, com um pequeno comentário entre parênteses sobre a homeopatia, e choveu e-mails me desautorizando (e me iluminando inclusive sobre os efeitos benéficos da homeopatia sobre a saúde dos tomates). Não, de fato não sou homeopata. Mas sou cientista. E qualquer um que tenha estudado química na escola é capaz de entender o seguinte: se medicamentos surtem efeito interagindo com o corpo, é preciso que haja ao menos uma moleculazinha do medicamento na dose que você ingere, certo?
Você trataria sua dor de cabeça com "aspirina 30C", vendida em bolinhas contendo 0,000 mg de ácido acetilsalicílico extraído naturalmente da casca do salgueiro? É um remédio orgânico, com todas as letras - mas a bolinha que você ingere não contém nem um centésimo de miligrama do princípio ativo, e provavelmente nem uma única molécula dele. Não tomaria? Sentir-se-ia enganado? Ficaria com vontade de processar a farmácia? A indústria farmacêutica que o produz, vendendo essencialmente água/farinha/açúcar como remédio? Seu médico? Pois é.
Acontece que, pelos preceitos da homeopatia, quanto mais diluída a substância, mais "eficaz" ela é - e as diluições usadas chegam a ser tão grandes que para haver uma única molécula do princípio ativo em uma dose de diluição 30C, como a da aspirina acima que faria você processar a farmácia, essa dose precisaria ter... 30 bilhões de vezes o tamanho de nosso planeta. Veja por você mesmo: a wikipedia traz uma revisão muito boa a respeito.
Sim, homeopatia funciona - como placebo, e portanto para as afecções que respondem ao efeito placebo, e somente essas. São doenças relacionadas a estresse, como asma, alergias, problemas digestivos, e também dor e aleitamento materno (ficar estressada reduz a produção de leite: se você acredita que está se tratando com bolinhas de homeopatia ou tintura de alfafa, pronto, isso pode até bastar para que seu cérebro decida que está tudo bem de novo e passe a comandar a produção copiosa de leite).
Não conheço o status da "medicina homeopática" no Brasil (e já sei que os médicos homeopatas que tiverem lido até aqui vão ficar ainda mais enfurecidos com as aspas). Mas sei que em outros países os "remédios homeopáticos" não são regulamentados como medicamentos. Se fossem, não poderiam ser vendidos - assim como qualquer indústria farmacêutica é processada por vender pílulas de farinha, como foi o caso da que vendeu pílulas anticoncepcionais sem princípio ativo por erro (você não acredita que uma indústria farmacêutica seria estúpida a ponto de se dar voluntariamente tamanho tiro no pé para fazer economia, acredita?).
Não me importo que os médicos homeopatas fiquem enfurecidos comigo. Não me importo que os adeptos da homeopatia fiquem enfurecidos comigo, me escrevam e-mails furiosos dizendo que eu não sei de nada, e continuem tratando suas pneumonias com pílulas de açúcar ou gotas de álcool vendidas como remédio. Enquanto houver uma alma em dúvida que ler meus protestos, decidir questionar a homeopatia e assim, por via das dúvidas, resolver dar à criança à sua mercê tratamento correto com moléculas reais de antibióticos e de quantos outros princípios atívos forem necessários, eu fico feliz.
Comentários
Eu escrevi recentemente sobre o assunto no Cultura Científica. Despertei a ira de alguns. Eu nunca qualifico os homeopatas como médicos, porque eles nunca aplicam em sua prática o que aprenderam nas boas faculdades de medicina.
A sociedade deveria reabrir a discussão sobre o reconhecimento de homeopatia como especialidade médica no Brasil. Dói-me o coração e o bolso cada vez que meu seguro de saúde paga uma consulta a um homeopata.
Interessante o seu post sobre homeopatia, mas mais interessante são as propagandas sobre cursos de homeopatia que o seu post atraiu para o seu blog.
Foi proposital ou puro acidente?
Um abraço
Adilson