C&T, Cultura Científica e Tecnocultura
Este post pertence à Roda da Ciência:
OK, OK, o mês está quase acabando, então vamos lá com este post, que fiquei adiando. É que eu detesto discutir Ciência e Tecnologia (C&T), porque o principal ataque dos românticos, anticientistas e outros criptonazistas à Ciência universalista "liberal-judaico-cristã" se dá justamente via a crítica da Tecnociência, do laço indissolúvel entre ciência, tecnologia e controle (estupro) da Mãe Natureza, e por aí vai...
E o cientista ingênuo (ou espertalhão), querendo mais financiamento das agências de fomento, fica enfatizando na mídia as "potenciais" (?) aplicações das ciências no desenvolvimento tecnológico e ecônomico (ou seja, na contramão das críticas ao desenvolvimentismo anti-ecológico). Espertalhão porque ele sabe que existe um LONGO caminho entre uma idéia científica, uma aplicação, um protótipo que funcione, uma patente, um processo de P&D, e a final comercialização. E, é claro, que essa comercialização, se houver, se dará por que no meio do caminho o cientista e sua Universidade venderam a patente para alguma multinacional... Ou seja, retorno claro, volumoso, direto, para a sociedade que financiou a pesquisa, neca das pitibiribas...
O retorno para a sociedade (civil) é "indireto", o governo pagando laboratórios, pesquisadores e estudantes nas Universidades públicas para se fazer pesquisa aplicada que em princípio as empresas é que deveriam deveriam fazer (montando laboratórios industriais que empregariam os futuros pesquisadores). Ou seja, o retorno é principalmente para as SA (pois pesquisa é uma coisa arriscada e empresas tentam maximizar os lucros e minimizar os riscos), não a SC (sociedade civil). Mesmo nos USSA (United Socialists States of America, segundo uma recente crônica no NYT sobre a estatização do sistema financeiro), basta aparecer uma turbulência que a primeira coisa que fecha nas empresas são os laboratórios de pesquisa.
Assim, para não perder de vista o quadro geral, lembremos e enfatizemos que ciência, tecnologia e cultura possuem intersecções, e também regiões de não intersecção. Qual a relevância da Paleontologia, Cosmologia, Paleoantropologia, Arqueologia, Astrobiologia, Planetologia etc para a Tecnologia? Nenhuma. Mas então elas não são ciências?
E dado que 99% da matemática é irrelevante para a Física, e que 99% da Física (teórica) é irrelevante para a Tecnologia, como ficamos? Que raios de Tecnociência é essa?
Na verdade, o grande impacto atual da Ciência é em termos de visão de mundo, que está se chocando com as visões de mundo tradicionais. Se forçadas a escolher, as pessoas irão escolher suas visões de mundo particulares (em geral religiosas, ou seja, visões de mundo que as "religam" à comunidade, à Natureza, ao seu inconsciente, etc), em vez de visões tipo Monod-Weinberg do tipo "O ser humano é um estranho no Universo, de onde emergimos por puro acaso, o esforço humano (e mesmo a Ciência) não possui nenhum significado, tudo será destruido em breve pela queda de um asteróide ou quando o Sol explodir ou, na melhor das hipóteses, tudo o que nos resta é esperar pela morte térmica do Universo etc e tal".
Essa visão de mundo (que eu desconfio ser advinda de uma falta crônica e patológica de serotonina nos cérebros de Monod, Weinberg, Dawkins, etc) se situa não na intersecção C&T, mas na intersecção C&Cultura. E vou avançar a tese de que a divulgação científica atual, inclusive aquela que estamos fazendo nesses blogs, pode ser contraproducente, pois evidencia o conflito C&Cult, de modo que as pessoas se apegamà Cultura (tradicional) e rejeitam a Ciência.
Finalmente, temos a intersecção da T&Cult (Tecnocultura). Isso vai desde a influência da Tecnologia nas Artes (tecnologia na música seria um belo exemplo) até a questão dos gadjets que vocês já comentaram. O importante é ter claro que os três domínios não se sobrepõe: um diagrama tríplice de Venn como o colocado acima ajuda a entender isso.
PS: Fazendo coro com o Daniel: Dado que o governo dos EUA vai gastar 700 bilhões de dólares (na verdade, o total é mais de 1 trilhão, ou seja, 100 vezes o preço do LHC, que é um consórcio internacional!), eu não vejo como é possível comentar (como tenho visto em inúmeros sites) que o dinheiro seria melhor gasto se enviado para a África ou transformado em cestas básicas...
E quanto o governo brasileiro perdeu nos últimos dias, em suas aplicaçlões financeiras na bolsa, compra de dólares, etc? Compare isso com a verba gasta na colaboração brasileira com os projetos do LHC. E olha que eu não simpatizo com Big Science, hein! Mas reconheço uma falácia quando a vejo...
E finalmente, se alguém ainda acha que se gasta muito com ciência básica no Brasil, então faça o favor de dar uma olhada nos editais do CNPq. Se você quer fazer ciência básica, é quase impossível se encaixar em algum edital do mesmo...
Por favor, os comentários devem ser deixados na Roda da Ciência.
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