Ela me parecia normal...




No nosso mundo pós-feminista muitas mulheres se orgulham de não serem racionais (afinal, ser racional é ser limitado, tapado, masculino e cartesiano). Tirei isso de um livro recente:

"Todas As Mulheres São Bruxas", lançamento da Editora Soler, é o meu quinto livro publicado. Mas não é um guia de feitiçaria. Nele você encontra algumas dicas, que aprendi na vida e na Ordem Rosacruz, para desenvolver este maravilhoso dom que a natureza deu as mulheres: o seu famoso sexto-sentido. E, ainda, várias histórias sobre as muitas bruxarias que as mulheres praticam, consciente ou inconscientemente, no cotidiano. A proposta, do que eu consideraria um novo feminismo, é levar a nossa contribuição, do hemisfério direito do cérebro, para o mundo construído pelos homens, onde predomina a testosterona, a agressividade, a competição bruta e a guerra. O mundo anda precisando da sabedoria feminina, de mais paz e mais docilidade. Os homens descobrem segredos feminos e as mulheres redescobrem a bruxa que há em cada uma delas. Leia. Você vai gostar. Em todas as livrarias.


Isabel Vasconcellos




Argh... Tudo bem. Sendo assim, vou assumir essa posição (a de que ser bruxa não é demérito) para propor uma hipótese evolutiva sobre a origem da irracionalidade (ou enfase na intuição e nos sentimentos) feminina. Como toda historinha evolucionária, esta provavelmente é falsa (e pior que isso, não é testável), mas nessa área de pesquisa, parece que o que importa é se é bene trovata. Mas antes disso, uma pausa para a fofoca que todo mundo está comentando...

RAFAEL GARCIA da Folha de S.Paulo

O astronauta brasileiro Marcos Cesar Pontes disse ter achado "estranho" o comportamento de Lisa Nowak. Ela e Bill Oefelein foram colegas de Pontes no curso de formação de astronautas do Centro Johnson, da Nasa. "Ela é da turma de 1996, e eu sou da turma de 1998, a mesma do Billy O. [Oefelein]", disse Pontes à Folha. Ele descreveu Nowak como "completamente normal". "É como se o comportamento não se encaixasse à pessoa que conheci."Os astronautas passam por uma triagem psicológica rigorosa na seleção, e depois por um treinamento para lidar com situações de estresse, mas não há como prever atitudes no plano afetivo. "O comportamento para vida social só é enfatizado no aspecto de trabalho em equipe, não no sentido de relacionamento amoroso", disse. "As linhas do amor fogem do normal."


Para ler mais:
Machos, fêmeas, câmeras e triângulos
Um pequeno passo no universo da mente
Astronauta tenta seqüestrar rival e acaba presa nos EUA

Triângulo amoroso abala comunidade espacial dos EUA


Minha hipótese bastante convencional é a de que as mulheres têm, supostamente, tendências a serem não-racionais, emocionais e atraídas pela magia, como essas tais "pós-feministas bruxinhas" destacam, devido à seleção bio-cultural machista. Ou seja, vejo dois fatores nisso, o ambiental e o biológico.

No nível socio-ambiental, isso pode ser apenas o reflexo de sua falta de poder (mulher que não chora não mama, e práticas de magia, simpatias, etc, visam a obter algo por meios outros que os da ação racional - ajuste concreto entre meios e fins). Se essa hipótese estiver correta, e se não houver nenhum fator biológico, uma futura sociedade totalmente igualitária irá eliminar esse aspecto "feminino" das mulheres: as mulheres obterão o que quiserem pela ação racional, não pela sedução, pela intriga ou pela sugestão mágica. Dispondo de status e poder igual aos homens, e meninos e meninas sendo educados de maneira idêntica, elas se tornarão psicologicamente iguais aos homens. Que pena, não é mesmo?

Mas é possível que a longa história de divisão de papéis sociais entre homens e mulheres tenha afetado a carga genética de nossas amigas, via coevolução genes-cultura. Ou seja, até recentemente, as mulheres mais racionais, fortes e independentes eram massacradas, não deixaram descendência. Se traços de sua personalidade estão ligados a genética (e, apesar do Marcelo Leite, sabemos que traços de humor e personalidade são herdáveis), então tais tendências podem ter sido selecionadas (ou melhor, as tendências contrárias terem sido eliminadas).

Em todo caso, o cenário de eliminação do "feminino" (note que tanto mulheres quanto homens podem ter personalidades com traços "femininos") talvez nunca se concretize. Isso porque a racionalidade (ou seja, a adequada análise de custo-benefício antes de cada ação) não é uma estratégia evolucionariamente estável. Meu exemplo principal é o seguinte: como toda mãe sabe (e todo pai também), ter filhos traz poucos benefícios no mundo moderno. Você se sacrifica por eles, eles não se sacrificam pela gente (especialmente os adolescentes!). Isso é um fato, não um julgamento moral.

Ora, mesmo no mundo pré-histórico, onde ter filhos talvez tivesse maior valor porque famílias grandes podiam se defender melhor, coletar mais alimentos etc, para a mulher era um risco irracional: a chance de morte no parto era muito grande, a tarefa de cuidar dos filhos é extenuante, etc. As mulheres frias e racionais deveriam ter poucos filhos. As mulheres irracionais, apaixonadas ou que adorassem bebês teriam muitos descendentes.

Colocando isso numa equação logística de dinâmica de populações, fica óbvio que tipo de mulher iria proliferar. Isso não mudou muito hoje: ou você acha que as adolescentes grávidas agem racionalmente?

Enquanto isso, nossas valorosas mulheres feministas não querem ter filhos, o que é uma ação totalmente racional da parte delas. Mas ao fazer isso, privam as futuras gerações de filhas que carreguem seus genes, talvez sua personalidade.

Bom, é claro que uma pessoa que acredita que tudo vem do ambiente e nada vem dos genes (pelo menos nada relativo à personalidade humana), essa minha teoria é pura bobagem. Mas se você perceber bem, essa pessoa está fazendo uma aposta: se a teoria de que o fator mais importante é o ambiente for correta, então as mulheres racionais não correm risco de extinção. Mas se a teoria for limitada e parcial, como toda teoria o é, e se os tais fatores biológicos existirem, as mulheres racionais serão extintas, em um processo de domesticação biológica ou seleção artificial similar ao feito para se obter, a partir de lobos ferozes, cães dóceis que gostam de crianças...

Eu acredito sinceramente que minhas amigas racionais não deveria fazer tal aposta. No atual estágio do nosso conhecimento, tal aposta seria irracional...

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