Teoria errante

OK, OK, primeiro uma Nature mostrando que tem, depois uma outra mostrando que não tem... Mas acho que é correto, um exemplo claro de que a ciência se auto-corrige. Eu mesmo demonstrei que a caminhada do Turista, ao contrário do afirmado em nosso PRL, não possui leis de potência.


07/11/2007 Por Fábio de Castro




Agência FAPESP – Um estudo publicado em 1996 na revista Nature apontou que o vôo do albatroz errante (Diomedea exulans), na busca de uma presa sobre o mar, seguiria a estratégia conhecida como vôo de Lévy – um padrão de movimento com propriedades fractais que ocorre em sistemas físicos e químicos descrito pelo matemático francês Paul Pierre Lévy.
O estudo era mais uma tentativa de demonstrar a existência do vôo de Lévy em sistemas biológicos naturais. Mas agora, um grupo internacional de pesquisadores, com a participação de brasileiros, acaba de mostrar o contrário. O trabalho foi publicado na edição de 25 de outubro da revista Nature.
De acordo com um dos autores, Marcos Gomes Eleutério da Luz, do Departamento de Física da Universidade Federal do Paraná, entender como animais buscam alimentos em seu hábitat e abordar o problema da otimização de estratégias de busca são importantes para o conhecimento sobre questões ecológicas e para a sobrevivência de certas espécies.
“Mostramos que o albatroz errante não realiza vôos de Lévy, embora ainda haja fortes evidências de que outros animais usam essa estratégia. Nosso objetivo principal era corrigir o trabalho de 1996, do qual participamos e que continha falhas de interpretação”, disse Luz à Agência FAPESP.
Os pesquisadores adicionaram dados colhidos a partir de dispositivos instalados em 20 pássaros às informações analisadas na pesquisa anterior. As aves foram estudadas na Geórgia do Sul, na Antártica – o albatroz errante é encontrado geralmente da Antártica ao trópico de Capricórnio. “O sistema preso nas patas das aves detectava quando o animal estava molhado (na água se alimentando) e quando estava seco (voando em busca de alimento)”, disse.
Alguns animais também receberam um dispositivo para a obtenção de detalhes sobre posicionamento, caracterizando sua trajetória com precisão. “Usamos o sistema conhecido como PTT, semelhante ao GPS”, disse Luz.
Segundo outro autor da pesquisa, Gandhimohan Viswanathan, do Instituto de Física da Universidade Federal de Alagoas, em um vôo de Lévy, ao contrário do movimento aleatório comum – o movimento browniano –, é possível tomar passos arbitrariamente grandes antes de uma mudança de direção. A trajetória se caracteriza por grupos de passos curtos ligados a passos longos mais raros.
“O comportamento total de deslocamento é dado pelo conjunto desses passos. Ao tentarmos descrever matematicamente esse processo, associamos tamanhos possíveis a cada um dos passos. Formalmente, em um vôo de Lévy, a distribuição de passos decai segundo uma lei de potência com expoente entre 1 e 3”, explicou.
Segundo Viswanathan, a probabilidade relativa de um passo muito grande ocorrer em uma estratégia de Lévy é bem maior do que em uma estratégia browniana, levando a uma otimização de busca. “Um movimento com passos ou vôos muito grandes deve aumentar a probabilidade de encontrar alimentos percorrendo uma distância total menor.”
De acordo com o pesquisador, como a seleção natural, entre outros fatores, age para selecionar as melhores respostas ao meio ambiente por parte de uma espécie, eventualmente certas espécies, em condições apropriadas, poderiam ter chegado à estratégia mais vantajosa do vôo de Lévy.
“O interessante é saber quando e por que uma espécie usa o vôo de Lévy e quando adota outra estratégia. Nosso estudo suscitará muitas outras pesquisas na tentativa de responder, por exemplo, se um animal poderia mudar de estratégia de acordo com o ambiente que ele encontra”, disse Viswanathan. Sistemas complexos
Para outro dos autores brasileiros do artigo, Ernesto Raposo, do Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco, o estudo não invalida a teoria matemática que aponta o vôo de Lévy como processo mais eficiente para a busca de comida pelos animais.
“O ponto crucial é que, para a teoria matemática ser aplicável, certas condições – como densidade da comida e o poder de detecção do animal caçador – devem ser satisfeitas. A questão é saber quando tais condições são aplicáveis para uma certa espécie de animal. Provavelmente, os albatrozes, ao contrário do que se pensava, não satisfazem os pré-requisitos”, disse Raposo.
Segundo o cientista, em sistemas tão complicados como os biológicos, vários fatores podem contribuir para um determinado comportamento. “Mesmo se o padrão de Lévy for o mais vantajoso, pode ser que determinado animal precise desempenhar outras tarefas, e não só procurar por alimento. Isso o levaria a não tentar otimizar exclusivamente a busca, não tendo motivos para seguir tal padrão.”
Raposo explica que muitos sistemas físicos, químicos e computacionais apresentam distribuições de Lévy para grandezas importantes que os caracterizam. Um exemplo são os elétrons que fazem “hopping” em polímeros.
“Um elétron pode ‘saltar’ ao longo de uma cadeia principal de polímeros – que são moléculas orgânicas muito grandes – auxiliado por flutuações térmicas. Esses saltos, em certas situações, podem apresentar uma distribuição que segue lei de potência, isto é, uma distribuição de Lévy”, disse.
O artigo Revisiting Lévy flight search patterns albatrosses, bumblebees and deer, de Andrew Edwards, Gandhimohan Viswanathan e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em
www.nature.com.

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