O Presidente Negro


"Nada revela mais sobre uma época do que sua visão do futuro" (não lembro quem disse isso).

Como o tema da Roda da Ciência ainda é sobre Ficção Científica e Divulgação Científica, vou fazer mais um post sobre o tema, aproveitando a coincidência entre a eleição de Barak Obama e o tema do único romance (por sinal, de FC) de Monteiro Lobato.

Eu quase não leio ficção científica atual, meu autor mais recente é Philip K. Dick. Mas gosto de colecionar FC antiga, justamente para conhecer as utopias e distopias de cada época, e perceber a incrível limitação da imaginação humana.

O livro de Monteiro Lobato deve ser lido pois revela uma época de relativismo cultural (anos 1900-30). Eistein ficou pop por causa do termo "Relatividade" em sua teoria. Se a mesma fosse chamada de "Teoria da Invariância" (como seria adequado) seu apelo popular não seria tão grande. As teses relativistas de Monteiro Lobato (na verdade não dele, mas de sua época) são:
  • As raças (etnias, culturas) possuem valores incomensuráveis;
  • Homens e mulheres também possuem valores incomensuráveis
  • A visão da modernidade democrática é ingênua: existem grupos dentro da sociedade que são fundamentalmente antagônicos e uma luta sem limites morais é o único caminho.
  • Dado que o diálogo e a negociação não são possíveis, por serem mecanismos burgueses, os conflitos se resolvem pela luta: que vença o mais forte.
Se você achar alguma semelhança com teses relativistas pós-modernas, não é acaso. Isso vem da tradição de Nietzsche e Heiddegger e depois de seus discípulos que as formalizaram como uma tese de esquerda (em contraste com toda a história do pensamento universalista de esquerda).

Lobato propõe humoristicamente uma "solução final" para o problema do negro nos EUA. Se arrependeu bastante quando uma solução final mais violenta foi aplicada aos judeus, quinze anos mais tarde.


Da wikipédia:

O Presidente Negro (originalmente denominado O Choque das Raças ou O Presidente Negro, e posteriormente, O Presidente Negro ou O Choque das Raças: romance americano do ano 2228), é o único romance (e de ficção científica) escrito por Monteiro Lobato.

Ayrton, desastrado cobrador da empresa Sá, Pato & Cia. sofre um acidente automobilístico na região de Friburgo (Rio de Janeiro) e é resgatado pelo recluso professor Benson, que o leva para sua residência. Ali, ele trava contato com a grande invenção de Benson, o "porviroscópio", um dispositivo que permite ver o futuro, e com Miss Jane, a bela e racional filha do cientista.

Através de Jane, Ayrton é posto a par da disputa pela Casa Branca nos Estados Unidos da América do ano 2228, onde a divisão do eleitorado branco entre homens (que querem reeleger o presidente Kerlog) e mulheres (que pretendem eleger a feminista Evelyn Astor), transforma o candidato negro, Jim Roy, no 88° presidente dos EUA.

A alegria dos negros, contudo, dura pouco. Incapazes de aceitar esportivamente a derrota, os brancos (agora novamente unidos) elaboram uma "solução final" para o "problema negro", muito mais sutil e eficaz do que aquela elaborada por Hitler para os judeus, pouco mais de uma década e meia após o lançamento do livro de Lobato.


Em 2008, a coincidência de dois pré-candidatos, um negro (Barack Obama) e uma mulher branca (Hillary Clinton) disputando a Casa Branca contra um candidato branco, despertou novamente a atenção da mídia brasileira para "O Presidente Negro". O livro ganhou nova edição da Editora Globo e, em algumas resenhas foi citado que Lobato teria previsto o surgimento da internet. Uma leitura atenta do livro revela que o autor falava de algo bem mais modesto, o "tele-trabalho": "em vez de ir todos os dias o empregado para o escritorio e voltar pendurado num bonde que desliza sobre barulhentas rodas de aço, fará ele o seu serviço em casa e o radiará para o escritorio. Em suma: trabalhar-se-á á distancia".[11]

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