UBIK
'Ubik' de PKD
Enviado por: "Eduardo Torres" dudutorres@yahoo.com dudutorres
Qua, 4 de Nov de 2009 5:03 pm
Nao lembro se foi discutido aqui o lancamento em julho ultimo de uma nova edicao no Brasil do seminal e obrigatorio 'Ubik', de Philip K. Dick, , pela Ed. Aleph. Do site da editora em http://www.editoraa leph.com. br/site/ubik. html
Dados Técnicos: ISBN:978-85- 7657-075- 2.
Tradução:Ludimila Hashimoto.
Edição:1a. Ano:2009.
Número de páginas:240.
Acabamento:Brochura . Formato:14x21cm.
Peso:0,300kg Preco: R$ 42,00
Sinopse da editora: Ubik Philip K. Dick Ubik é uma irreverente história sobre a morte e a salvação escrita pelo consagrado escritor americano Philip K Dick. Foi eleito em 2005 pela revista TIME, um dos cem melhores romances de língua inglesa, publicados a partir de 1923. Em uma sociedade futurista, Glen Runciter é dono de uma empresa responsável por rastrear psis, indivíduos com habilidades especiais, como telepatas e precogs. Ele e seus funcionários caem na armadilha de uma empresa rival, e Runciter morre. Seus funcionários passam a receber estranhas mensagens de Runciter em moedas e embalagens de cigarro. O tempo começa a retroceder e eles terão que lutar contra a degeneração física e mental. A solução pode estar no spray Ubik, mas conforme a trama se desenvolve, menos fica claro quem realmente precisa ser salvo.
---- E ja' q estamos falando em Dick (epa!) nada melhor q um artigo do maior especialista em Dick (epa! epa!) no Brasil, nosso colega de lista Lucio Manfredi:
DICK E O SIMULACRO, por Lúcio Manfredi
Ubik é a forma anglicizada do latim ubique, advérbio que significa "em todo lugar". Designa, pois, a ubiqüidade, a onipresença que é um dos atributos de Deus. No romance de Philip K. Dick, será de uma manifestação de Deus que se trata? Certamente é o que a epígrafe do último capítulo dá a entender, quando Ubik se identifica simultaneamente ao Logos cristão e ao Tao chinês: "Sou Ubik. Antes de existir o universo, já eu existia. Eu fiz os sóis. Fiz os mundos. Criei as vidas e os lugares que elas habitam. Levo-as para ali, ponho-as acolá. Elas vão aonde eu digo, fazem o que lhes indico. Eu sou o verbo e o meu nome jamais é invocado, o nome que ninguém conhece. Chamo-me Ubik, mas não é esse o meu nome. Eu sou. Sempre serei."
De fato, o texto de Dick imita o estilo do Livro da Sabedoria bíblico, permitindo identificar Ubik àquela entidade feminina, a Sabedoria de Deus, que os cabalistas denominaram Shekinah e os gnósticos chamaram de Sophia . De acordo com a gnose, Sophia é a responsável pela redenção do homem, mergulhado num mundo ilusório. É esse papel de conduzir o ser humano à verdade que Ubik desempenha no romance. Tanto ele quanto a personagem de Ella Runciter, que fornece o Ubik ao protagonista, podem ser considerados como representações alegóricas de Sophia.
Ora, é digno de nota que o Ubik apareça sob a forma de um spray milagroso. E cada uma das dezesseis epígrafes que antecedem a revelação de sua verdadeira natureza identifica Ubik a um artefato industrial. Assim, ele é sucessivamente um aparelho elétrico de função não especificada, uma cerveja, uma marca de pó de café, uma marca de molho, um antiácido, uma lâmina de barbear, um verniz sintético, uma financiadora, uma loção para cabelo, um desodorante, um sonífero, um tipo de geléia, um sutiã, uma embalagem plástica, uma espuma germicida e uma marca de cereais.
O próprio tom das epígrafes simula a linguagem publicitária: "Basta friccionar com loção Ubik. Apenas em cinco minutos, descobrirá novo vigor no seu cabelo, novo brilho." Mas, nas entrelinhas, perfeitamente dissimulado no tom geral do anúncio, algumas frases indicam a verdadeira função do produto: "um sabor inteiramente novo e diferente para o paladar, e que está a despertar o mundo "; "Ubik fá-lo voltar de novo ao âmago das coisas"; "ela retirará de sua alma toda inquietação"; "levam-no de novo ao coração dos acontecimentos" ; "erga os seus braços e sinta-se livre ".
Trata-se, pois, de um produto - mas de um produto destinado a libertar as pessoas, despertá-las da letargia em que se encontram, conduzi-las em direção ao real de que elas estão separadas pelo simulacro. Contudo, por que Dick o simbolizaria através desses simulacros por excelência que são os artefatos industriais e os slogans publicitários? Ironia, claro. Mas uma ironia com finalidades mais profundas do que simples efeito humorístico. Por que, de fato, o que Dick dá a entender através dessa ironia é que só podemos nos libertar da sujeição aos simulacros através dos próprios simulacros .
É curioso que a maior parte dos estudos a respeito das concepções desse autor passe por cima desse fato: a visão dickiana é muito mais dialética do que a batida oposição entre ser e parecer, a aparência contrapondo- se à essência. Porque só as aparências, por distorcidas que sejam, revelam uma qualquer essência e o parecer é a única via de acesso ao ser. Se não, por que Wilbur Mercer, o messias empata de O Caçador de Andróides , seria não mais que um ator num cenário de papelão?
Se repassarmos a obra de Dick sob esse prisma, verificaremos que, de um modo ou de outro, todos os messias imaginados por ele resolvem-se em algum tipo de simulacro ou simulação. Já em sua primeira novela, Loteria Solar , os membros de uma seita partem para o espaço na pegada de John Preston, seu fundador, apenas para deparar com ele na forma de "alguma substância volátil, na qual está sendo projetada uma imagem. Os projetores de áudio e vídeo estão sincronizados para formar uma réplica perfeita de Preston. Ele está morto há 150 anos".
Em A Invasão Divina , Emmanuel é orientado por um aparelho através do qual a parte divina do Deus feito homem comunica-se com a parte humana. Um dos aspectos adotados por esse aparelho - em O Mistério de Valis e Radio Free Albemuth - é o de um artefato alienígena, um satélite artificial em órbita da Terra, que se comunicaria com alguns eleitos para fazer com que eles despertassem e levassem ao resto do mundo a mensagem de que vivemos nós mesmos num mundo-artefato, um satélite artificial da verdadeira realidade: "Estamos num labirinto que foi construído por nós, em que caímos e de onde não podemos sair. Na essência, VALIS dispara seletivamente informação sobre nós, que nos ajudam a escapar do labirinto, a encontrar o caminho da saída. [...]
Éramos grandes construtores, mas um dia decidimos jogar a sorte. Fizemo-lo voluntariamente; éramos tão bons construtores que podíamos construir um labirinto cuja saída mudava constantemente; apesar da saída, na verdade não havia saída para nós porque o labirinto... este mundo... estava vivo. Para tornar o jogo em algo real, em algo mais que um exercício intelectual, resolvemos perder as nossas faculdades excepcionais, reduzir-nos um nível inteiro. Infelizmente, isso incluiu a perda de memória... a perda do conhecimento das nossas verdadeiras origens." Trata-se, não reste a menor dúvida, de um mito gnóstico em versão sci-fi . No enredo do romance, aliás, esse mito é transmitido de forma cifrada através de "um filme barato de ficção científica", uma ópera-rock de Eric Lampton. Seu veículo, portanto, é a indústria cultural: o cinema e o rock. E sua fonte é uma inteligência artificial:
"VALIS é uma construção. Um artefato. Está ancorado aqui na Terra, literalmente ancorado. Mas como o espaço e o tempo não existem para ele, VALIS pode estar em qualquer parte e em qualquer tempo que quiser." Da mesma forma que as "unidades de simulacro" que formam o indecidível de Derrida, tanto quanto o mercúrio dos alquimistas, VALIS apresenta a propriedade de ser uma complexio oppositorum : "É uma voz neutra. Nem masculina nem feminina. Sim, parece de uma inteligência artificial."
As novelas de Dick, portanto, não "gravitam em torno do problema de se separar o real e o Ersatz ". Seu escopo é, ao contrário, mostrar que a única maneira de se alcançar o real é engajar-se num jogo dialético com o Ersatz . O simulacro é, sim, um objeto falso, na medida em que ocupa o lugar do real. No entanto, trata-se de um lugar que o real é impossível de ocupar, um lugar que só pode ser preenchido pelo simulacro, por debaixo de cuja sucessão o real desliza, invisível e oculto ( fallo , raiz de falsus ), mas irremediavelmente invisível e necessariamente oculto, sem jamais se fazer visível senão por meio de sua ausência do lugar que o simulacro ocupa. É por esse motivo que, ao final de Valis, o protagonista espera a próxima revelação divina sentado diante da televisão, esse ogro dos apocalípticos, que substitui o mundo real por uma tele-realidade fictícia. Fonte: http://clfc. tripod.com/ Dick.htm Boa leitura e releitura. Pelo repasse, Eduardo Torres
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